Diante da necessidade de deter o avanço da crise climática, a indústria empreende uma bussca por alternativas aos HCFC e HFC; os chamados fluidos naturais são candidatos ao posto

 Os fluidos refrigerantes naturais, como a amônia (NH3) e o CO2 eram largamente utilizados até as primeiras décadas do século passado em sistemas de refrigeração. O advento dos clorofluorcabonetos(CFC), quimicamente estáveis, não inflamáveis, com baixa toxicidade e baixa ebulição trouxeram, num primeiro momento, vantagens em sua aplicação, deslocando os fluidos tradicionalmente utilizados até então. No entanto, ao longo das décadas de 1970 e 80, inúmeros estudos passaram a apontar os CFCs como uma das principais substâncias a contribuir para a destruição da camada de ozônio.

Assim como atualmente existem os negacionistas do clima, inclusive entre especialistas em sistemas de ar-condicionado e refrigeração, que tentam atribuir a causas naturais, independentes de ação humana, as alterações climáticas, também houve quem se negasse a reconhecer o papel dos CFCs na degradação da camada de ozônio. No entanto, sob pressão das evidências e de organizações sociais responsáveis, a necessidade das substituições se impôs e o mercado aos poucos foi procedendo à substituição dos CFCs por fluidos refrigerantes mais amigáveis ao meio ambiente.

A opção que se mostrava mais viável ambientalmente, tanto do ponto de vista da eficiência energética, quanto em relação à preservação da camada de ozônio, é o hidrofluorcarbono (HFC), até hoje largamente utilizados, mas em vias de substituição. Isso porque as evidências passaram a apontar tais substâncias comofortes contribuintes do aquecimento global. Novamente, diante das evidências, o mundo passou a discutir a sua substituição. No âmbito do Protocolo de Montreal, a Emenda de Kigali entrou em vigor em 1ode janeiro de 2019 se propondo a reduzir, escalonadamente até a extinção, o consumo dos os HFCs. Neste sentido, o Brasil se compromete a congelar o consumo dessas substâncias a partir do corrente ano.

Agora, além de eliminar substâncias com alto ODP (Ozone DepletationPotential – Potencial de Destruição da Camada de Ozônio), como os CFCs e HCFCs, faz-se necessário cessar o uso de fluidos com alto GWP (Global WarmingPotential – Potencial de Aquecimento Global). E a indústria tem se movimentado para desenvolver alternativas que atendam essas duas necessidades. A Daikin, que também fabrica fluidos refrigerantes, além de equipamentos, lançou o R-32, um HFC puro de baixa inflamabilidade e alta eficiência energética. A maioria dos fabricantes tem se orientado pela utilização da substância em sistemas splits e bombas de calor.

Outros fabricantes de fluidos refrigerantes, comoa Chemours, têm desenvolvido as hidrofluorefinas (HFOs), compostos orgânicos insaturados em cuja composição entram hidrogênio, flúor e carbono. Com baixa inflamabilidade, baixo ODP e baixo GWP, algumas formulações, como o HFO-1234yf,já são alternativas para equipamentos de grande capacidade, como os chillers.

A busca por respostas colocou, novamente, os fluidos naturais em evidência. A amônia (NH3), particularmente quando utilizada como refrigerante primário, tem ganhado espaço, principalmente na Europa. Da mesma maneira o CO2 e os isobutanos. Os grandes obstáculos para sua utilização estão, respectivamente, na toxicidade, altas pressões de trabalho e inflamabilidade.

A amônia na climatização

O NH3 já é largamente utilizado em sistemas de refrigeração industrial. Este tipo de aplicação não representa grandes riscos na sua utilização. A começar pelo fato de estarem, em geral, confinados a áreas abertas e cercadas de toda a segurança, garantindo que, em caso de vazamento, as pessoas envolvidas nos processos não serão atingidas. Por outro lado, pressupõe-se que as equipes de operação possuem suficiente treinamento para conter os riscos embutidos nos sinistros.

O desafio maior é, portanto, sua utilização em aplicações de conforto, enquanto refrigerante primário. Um debate dessa natureza sempre estará mediado pelas estratégias comerciais das empresas e atores envolvidos. Fabricantes de HFOse outras substâncias próximas, tenderão a maximizar os riscos. Na outra ponta, fabricantes de equipamentos que trabalham com amônia, assim como com dióxido de carbono ou isobutanos, minimizarão as dificuldades para controlar eventuais acidentes.

A Mayekawa, por exemplo, aposta tanto nas vantagens da amônia para aplicação em climatização de conforto, que até instalou um sistema do tipo para climatizar sua sede na Grande São Paulo. A eficiência energética é a principal vantagem apresentada, como de resto em qualquer tipo de aplicação. Mas, alerta, não é qualquer sistema. No caso da empresa a opção recaiu sobre uma instalação que reduziu o uso de amônia em cerca de 95 por cento, sem perder a eficiência.O sistema, que funciona desde 2019, atende aos 1600 m²do edifício de escritórios, composto por dois pavimentos de 20 x 40 m², onde se localizam as áreas administrativas e técnicas. Cerca de 150 pessoas circulam diariamente nos espaços.

Sem dúvida, estamos diante de um sistema de baixa carga de refrigerante, aliás tendência perseguida não apenas no caso da amônia, mas de qualquer outro fluido refrigerante. “Os equipamentos Mayekawa são projetados para uma baixíssima carga de amônia, sendo que todos os projetos são feitos com as mais rígidas normas de segurança, e são testados em fábrica para evitar vazamentos e reduzir os riscos. Juntando a alta eficiência, a baixa carga de amônia e todos os cuidados com segurança, os equipamentos são muito interessantes em aplicações de climatização para conforto”, diz um porta-voz da empresa.

Eficiência energética é, também, o argumento principal de Felipe Costa, gerente de vendas da Vastin. “A amônia é muito indicada, pois, tem economia térmica e rendimento promissor em relação à refrigerantes halogenados e inflamáveis”. O especialista da Vastin ressalta os condicionantes para a utilização. “Medidas de segurança quanto a vazamentos em salas de máquinas, sensores para detecção de vazamentos, exaustores de emergência, atendimento à NBR 16069/2018 e atendimento à Cetesb P4.261, que permite instalações com até 300 kg de amônia com distância de vizinhos. Além de chillers com baixa carga de amônia e trocadores à placas, trocando calor entre glicol e água, sendo os sistemas com trocas entre amônia x glicol e glicol x água.”

A Mayekawa vai no mesmo sentido. De acordo com seus representantes, aamônia só não poderia ser indicada em instalações para conforto em caso de não existir um local adequado para a central, que proporcione segurança para os operadores e usuários. Esse local deve ser arejado e passível de ser monitorado. As boas práticas de operação são sempre requeridas.

Segurança do sistema

Além dessas recomendações gerais, existem algumas questões que embora óbvias merecem sempre ser esclarecidas. “Sabemos que metais como cobre não podem ser utilizados em sistemas com fluido amônia (diferente da aplicação com fluidos halogenados), assim sendo, o indicado são válvulas em aço carbono que atendam as características de pressão e temperatura da instalação”, lembra Costa, da Vastin.

Em relação aos trocadores a serem utilizados, Costa aponta os de placas como os de melhor desempenho. A Mayekawa, por outro lado, apontando as boas práticas de projeto da empresa, afiança que todos os trocadores são adequados para a aplicação, ressaltando queaqueles totalmente soldados apresentam menor risco de vazamento.Além disso, segundo suas fontes, os equipamentos da empresa são projetados para uma baixíssima carga de amônia, sendo todos os projetos desenvolvidos seguindo rígidas normas de segurança e testados em fábrica para evitar vazamentos e reduzir os riscos.A empresa também oferece o condensador a ar microcanal, tornando o equipamento mais compacto e com menor quantidade de NH3, comparado com os padrões de tubo aletado.

Ainda em relação à segurança, a Mayekawa estabelece o sistema de troca indireta utilizando água ou ar nos ambientes climatizados, garantindoa máxima eficiência energética proporcionada pela amônia, com a segurança recomendada nos ambientes ao manter a amônia confinada à sala de máquinas.

Sem dúvida, a amônia, assim como o CO2 e o propano, são refrigerantes de baixo custo e elevada eficiência energética. No entanto, diante dos riscos comumente apontados, as características positivas não seriam ofuscadas?

“Em comparação com R-404, R-32 e R-134ª, ou gases inflamáveis, a amônia oferece menor risco, pois, a temperatura de combustão é de 6300C. Além disso, para o conforto térmico, a quantidade de amônia utilizada é pequena comparada a aplicações em sistemas de refrigeração industrial, não oferecendo riscos significativos pela quantia utilizada e pelo fato de utilizar-se de precauções como dispositivos de segurança e atendimento à normas reguladoras”, afirma o gerente de vendas da Vastin.

Segundo a Mayekawa, “os fluídos naturais como a amônia, o CO2 e o propano são os mais eficientes e ecológicos, mas o seu uso gera discussões quanto a segurança. Analisando todos os aspectos, temos muitos benefícios para o meio ambiente e para o cliente, tanto por terem fator zero em ODP e GWP, quanto pelos custos com energia elétrica. Os riscos desses fluídos podem ser muito reduzidos com boas práticas e know-how da empresa fabricante. Outro item importante é a manutenção das instalações; tubulações com oxidações e sem aperto adequado do parafuso podem aumentar o risco, por isso é muito importante uma manutenção preventiva.”

“A Europa e os Estados Unidos já utilizam há muito tempo a amônia para conforto térmico, já que é um fluido com 0 GWP e ODP, seguindo o anseio mundial para redução de gases que causam o aumento do efeito estufa.A amônia é altamente recomendada para este tipo de aplicação, visto que o mundo já se dispõe a ter aviões, carros, navios, tratores, caminhões e trens movidos à amônia.Em comparação com tipos de gases halogenados e inflamáveis,a amônia é imensamente mais vantajosa e eficiente”, defende Costa.

Veja também:

Componentes de um sistema por amônia

O exemplo começa em casa

A opção pelo R-32

 

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