Conceitos NZEB e ZEB

 A contribuição essencial do setor de AVAC-R para a mitigação da crise climática é ter consciência de que a maior fonte de energia para o mundo deve ser a eficiência energética

Considerações

O setor do ambiente construído é responsável por 37% das emissões globais de carbono referenciadas ao uso de energia.Tal percentual engloba tanto as chamadas emissões corporificadas, quanto as emissões operacionais, cuja totalização constitui a pegada de carbono da edificação ao longo do seu ciclo de vida.

As emissões operacionais estão relacionadas ao conceito de Edifício com Balanço Energético Nulo (NZEB) e a pegada de carbono ao conceito de Edifício com Balanço Nulo de Carbono ou Edifício com Emissão Zero (ZEB).

Por volta de 1850, época da revolução pré-industrial europeia, a quantidade de CO2 contida no ar atmosférico era de 280 ppm. A partir do uso de combustíveis fósseis esse valor foi aumentando gradualmente, atingindo 320 ppm em torno de 1960 e 420 ppm na atualidade.

O teor aumentado de CO2 na atmosfera provoca aquecimento global, uma vez quebloqueia a irradiação refletida pela terra em direção às baixas temperaturas do universo,prejudicando o processo de rejeição daentropia terrestre resultante do consumo da exergia solar utilizada nos processos produtivos que ocorrem no planeta, inclusive a produção de carboidratos e proteínas, indispensáveis para a preservação das espécies vivas, notadamente a humana.

Desequilíbrio ambiental

Artigo intitulado “Soluções Climáticas para a Nova Década”, de autoria da ONG Drawdown.org, aborda em detalhes e propõe soluções para reduzir as emissões e maximizar as potencialidades de sequestrar carbono dos sumidouros naturais de que o planeta dispõe.

Segundo o estudo, há uma parcela de 59% do total das emissões provocadas depositando-se na atmosfera, uma vez que a capacidade dos ecossistemas em absorvê-las é de apenas 41% desse valor (IPCC 2014).

A proposta do estudo indica providências para redução das emissões praticadas e para restauração das potencialidades debeladas dos sumidouros terrestre e marítimo, de forma que, a depender do cenário a ser adotado entre as duas proposições feitas, obter-se-ia o equilíbrio entre emissões e sequestro na metade do século, cessando a tendência em curso de acréscimo do teor de CO2 na atmosfera e, a partir daí,passaria a haver uma reversão no sentido da retração do valor acrescido. Em contraposição, a temperatura média do planeta seria acrescida de 1,5°C ao final do século na hipótese de adesão ao cenário mais ambicioso, e de 2°C no cenário menos abrangente. Já o teor de CO2 atingiria 490 ppm-eqem 2045 no cenário mais ambicioso, enquanto no cenário menos abrangente atingiria 540 ppm-eqem 2050, cessando então o crescimento e passando a reduzir-se a partir das respectivas datas futuras já mencionadas. Isso corresponderia ao atendimento das condições estabelecidas no Acordo de Paris.

Considerando o cenário mais ambicioso, as previsões do projeto proposto resultariam em evitar entre os anos 2020 e 2050, 1.576 Gt de CO2eq, sendo 75% referentes à redução de emissões e 25% referentes à restauração das capacidades dos sumidouros em sequestrar carbono.

Busca pelo equilíbrio

O Programa Ambiental das Nações Unidas (UNEP na sigla em inglês) – Materiais de Construção e Clima – Construindo um Novo Futuro – indica uma equalização percentual de contribuição de emissões corporificadas e operacionais até 2050, considerando que os valores para 2021 são, respectivamente, 75% para emissões operacionais e 25% para emissões corporificadas. Isto significa redução mais acentuada nas emissões operacionais, masredução proporcional em ambas as formas de emissão.

O programa estabelece melhoria de eficiência nos processos de produção de materiais de construção não renováveis e transição para materiais renováveis.

Praticar a utilização de energia renovável na produção de materiais não renováveis, tais como concreto, aço, alumínio, plástico e vidro, além da substituição, no todo ou parcialmente, de estruturas convencionais de concreto armado em edificações de alturas baixa ou média, ou de trechos modulares em edificações altas, por materiais renováveis como, por exemplo, estrutura em madeira maciça.

Cada molécula da biomassa produzida a partir da fotossíntese solar é composta por 6 átomos de oxigênio, 12 de hidrogênio e 6 de carbono, daí a denominação de carboidrato; portanto, sequestra carbono da atmosfera. O carbono é extraído do ar atmosférico, enquanto o hidrogênio e o oxigênio são extraídos de água captada pelas raízes. Já o ferro, aço e cimento liberam,para a atmosfera,carbono rejeitado em altos fornos no processo de fabricação.Daí a classificação em carbono negativo e carbono positivo na quantificação para totalização do teor de carbono do produto final, a edificação.

Além do mais, empregar energia renovável em altos fornos para fabricação de aço, alumínio, cimento e vidro, bem como, adotar Circularidade Econômica, fazendo reuso de materiais ao fim da vida útil de edificações, ao praticar a desconstrução metodizada em vez da demolição desordenada, viabilizando a reciclagem – de modo a transformar a sepultura de uma edificação no berço da substituta – são providências indispensáveis no caminho para o equilíbrio ambiental.Outro exemplo é a reciclagem de produtos de vida útil breve como embalagens de vidro para medicamentos, alimentos e perfumes, adotando-as como matéria-prima pronta, livre de processo produtivo em altos fornos, para fabricação de vidros planos para edifícios com vida útil de 50 anos e mais.

Impacto do AVAC-R na pegada de carbono do ambiente construído

A contribuição do setor AVAC-R no processo de descarbonização representa 25% do valor global indicado no Projeto Drawdown, compondo-se de 75% de emissões operacionais e 25% de emissões corporificadas.Considerando o caso específico dos fluidos refrigerantes, cuja participação em emissões corresponde a 37% da contribuição do setor AVAC-R, a carga inicial é contabilizada como emissões corporificadas e as reposições por vazamentos são contabilizadas como emissões operacionais.Dessa contribuição, 53% são relativos ao gerenciamento do uso e 47% são relativos a refrigerantes alternativos.

O gerenciamento do uso envolve detecção à distância (Machine Learning) e providências tempestivas para estancamento de vazamentos, entre outras medidas, enquanto os refrigerantes alternativos envolvem mitigação de emissões por apresentaremGWPsbaixos (misturas entre HFCs eHFOs) ou muito baixos (HFOs).

A detecção de vazamentos usa como parâmetro de monitoramento a temperatura de descarga do ciclo de compressão mecânica, afetada que é fortemente mesmo no início do vazamento, uma vez que a perda de refrigerante majora desde logo o superaquecimento na sucção, o que provoca alta elevação da temperatura de descarga do gás refrigerante, afetado mais do que qualquer outro parâmetro operacional na hipótese da ocorrência de vazamento.

A Agência de Proteção Ambiental (EPA na sigla em inglês) estabeleceu um limite de GWP menor que 700 para equipamentos novos a partir de janeiro de 2025, enquanto a União Europeia estabeleceu uma meta de redução de 2/3 nas emissões de fluidos refrigerantes até 2030, comparadas às emissões relativas a 2014.

Seguem outras características abordadas no estudo para eficientização energética e redução de emissões pelos sistemas de AVAC-R:

– Integração a sistema elétrico fotovoltaico;

– Tratamento isotérmico de edificações e instalações;

– Vidros de alto desempenho;

– Aquecimento solar para água quente sanitária predial;

– Sistemas térmicos distritais;

– Bombas de calor de alta eficiência;

– Termostatos inteligentes;

– Tetos frios verdes.

Cabe ao mercado fornecedor – consultor, projetista, fabricante, instalador e mantenedor – adotar providências de contribuição ao equilíbrio ambiental, também com respeito aos materiais, equipamentos e instalações, considerando o compromisso conjunto com os conceitos NZEB e ZEB, ou seja, mitigação de emissões operacionais e corporificadas.

Normas técnicas

As regulamentações para determinação das classificações NZEB e ZEB são estabelecidas nas Normas Técnicas ANSI/Ashrae Standard 228-2023,cuja edição inicial data de março de 2023,e BSR/Ashrae/ICC Standard 240P, esta última ainda sob consulta prévia eversando sobre a quantificação das emissões de gases de efeito estufa no ciclo de vida da edificação.

A Standard 228-2023 traz uma informação inédita e importantíssima para determinação das emissões relativas aos fluidos refrigerantes, qual seja, na tabela 9, os percentuais anuais de vazamentosreferenciados às correspondentes cargas de refrigerante por tipo de sistema.

Tomando por base as taxas de vazamento informadas para sistema por expansão indireta e por expansão direta por fluxo variável de refrigerante, chega-se à conclusão de que a massa de gás liberada na atmosfera por vazamentos é 4 vezes maior no sistema por expansão direta, considerando que o percentual é o dobro (10% contra 5%) e que a carga de gás também é pelo menos o dobro, uma vez que as cargas em chillers e em unidades condensadoras são equivalentes, e que a carga no circuito frigorífico é, pelo menos, idêntica à das condensadoras, o que resulta na carga duplicada do sistema.

Atente-se, ainda, aos valores dos respectivos GWPs, 1920 para o R-410A e 1300 para oR-134a, o que leva a relação entre emissões, produto da massa pelo respectivo GWP, para um valor 6. A mitigação da magnitude da carga de fluido refrigerante, ao lado de um reduzido GWP e de um eficaz gerenciamento são fatores transcendentais na procura pela descarbonização, equilíbrio ambiental e sustentabilidade.

Conclusão

A contribuição essencial que o setor de AVAC-R pode dar para a mitigação da crise climática é ter consciência de que a maior fonte de energia para o mundo deve ser a eficiência energética, e que a energia mais barata e limpa é aquela que é evitada sem que haja prejuízo de resultado doobjetivo fim a ser alcançado – A Qualidade Ambiental Interna (IEQ na sigla em inglês).Para tanto, é indispensável aplicar os preceitos da Transmissão de Calor, da Mecânica dos Fluidos, da Psicrometria e da Termodinâmica.Com isso, obter-se-ão instalações economicamente viáveis, energeticamente eficientes e ambientalmente sustentáveis, compatíveis com o conceito ESG.

Em termos de tecnologias, destacaríamos os sistemas de baixa exergia, providos de desacoplamento total entre cargas e arranjados em cascata, o que otimiza a relação entre qualidade da fonte e a exigência da carga, empregando processos radiantes de resfriamento, edificações termicamente ativas e processos independentes de controle da temperatura e da umidade (THIC na sigla em inglês). Tais sistemas resultam em redução de 42% no consumo deenergia elétrica, 45% no consumo deágua e evitam76% deemissões, constituindo-se em ótima opção na direção de se obter edificações com classificações NZEB e ZEB.

Não há como pretender prevenir mudanças climáticas tentando influir nas ações de suprimento deexergia de aquecimento,governadapelo Sol, ou de exergia de resfriamento,governada pelo Universo.Prevenir-se-ão através do controle das ações que ocorrem no planeta, maximizando a eficiência do uso da exergiaoriunda de fontes naturais renováveis e mitigando, tanto quanto possível, a geração de entropia.Daí não ser lógico consumir exergia evitável, mesmo que oriunda de fontes naturais, pois, inevitavelmente, estaria sendo gerada entropia evitável em prejuízo do equilíbrio ambiental, inegociável que o é.

Francisco Dantas é engenheiro mecânico, é consultor na Interplan Planejamento Térmico Integrado

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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