O mercado europeu oficializou a permissão para o aumento do limite de carga de hidrocarbonetos em equipamentos self, anteriormente de 150 g, para 500 g. Em vista desse fato, ouvimos dois especialistas em refrigeraçãocom familiaridade com os fluidos refrigerantes emergentes. São eles, César Augusto Pacheco, da área de pesquisa e desenvolvimento da Eletrofrio, e Sidney Mourão, representante de vendas para o mercado brasileiro da Dorin.

Mudança torna viável a aplicação em refrigeração comercial de grande porte

É importante ressaltar que o valor de 500g é um arredondamento para a divulgação da normativa. Os valores de carga máximo são calculados conforme o limite inferior de flamabilidade de cada fluido refrigerante. Para o propano (R-290) o valor exato é de 494g, já para o isobutano (R-600a), outro hidrocarboneto comumente utilizado, esse valor é de 559g. O acréscimo afeta também os fluidos A2L (como o R-1234yf), sendo que para essa família o valor máximo agora é de 1,2 kg.

Esse aumento na carga de fluido permissívelvisa minimizar uma das principais desvantagens de utilizar fluidos inflamáveis: limitação da capacidade de refrigeração do sistema. Considerando o limite de 150g por circuito, os sistemas de média temperatura, por exemplo, ficam limitados em capacidade de evaporação na faixa de 1 kW, pois sistemas maiores resultariam em acréscimo do superaquecimento, afetando a performance do sistema. Já para cargas de 494g, podemos prever a aplicação em sistemas de até 3 kW na média temperatura, por exemplo.Portanto, esse acréscimo na capacidade permite que os sistemas self sejam aplicados em equipamentos de maior porte, deixando de ser solução apenas na refrigeração doméstica e comercial leve, mas também sendo economicamente viável na refrigeração comercial de grande porte.

Atualmente, a legislação brasileira não possui nenhuma diretriz que especifica limites de fluido inflamável em sistemas de refrigeração self. Por esse motivo, os fabricantes nacionais guiam o desenvolvimento de seus produtos, no que tange a esse assunto, com base nas normas internacionais. Cada aplicação diferente exige que o fabricante faça as análises necessárias de risco para compreender se a quantidade de fluido refrigerante utilizada e o método construtivo do produto são condizentes e seguros.

A liberação de maiores cargas pela IEC 60335-2-89:2019 e pela EN 60335-2-89:2022 são um forte indício de que o mercado brasileiro pode adotar esses novos valores, porém, a velocidade que isso vai ocorrer ainda é uma incógnita. Como estamos observando atualmente no mercado europeu, existe um gargalo produtivo e ético entre permitir uma maior carga de fluido inflamável e a sua efetiva aplicação no mercado. Sistemas com maiores cargas são definitivamente mais perigosos do que sistemas com até 150g e exigem que medidas extras de segurança sejam aplicadas, tanto na produção do produto quanto no local de instalação. Um desses impacto é a necessidade de uma “área mínima de instalação” para sistemas com carga superior à 150g. Para efeitos de exemplificação, conforme IEC, um sistema com até 150g pode ser instalado em um minimercado de 10 m². Já um sistema com 400g de R-290 deve ser instalado em ambientes de, no mínimo, 19 m².

Para analisar o impacto no consumo energético podemos comparar um sistema self utilizando R-290 versus um sistema utilizando R-404A (fluido comum para equipamentos na refrigeração comercial). A Tabela 1 mostra os dados de um sistema de expansão direta teórico, de média temperatura e com capacidade de evaporação de 3 kW. Podemos verificar que os sistemas utilizando R-290 possuem um COP aproximadamente 12% superior, resultando diretamente na redução do consumo de energia do cliente final. Conforme explicado anteriormente, o acréscimo no limite permite aplicar o R-290 em uma parcela maior dos equipamentos de refrigeração de um supermercado e, por consequência, otimizar o consumo de energia como um todo.

Já no quesito ambiental, a grande vantagem do R-290 está em atuar como substituto aos HFCs e HFOs. Conforme visto na Tabela 1, o R-404A (HFC comumente utilizado) possui GWP de 3922, contra um GWP de 3 para o R-290. Além do GWP indicar um potencial de aquecimento global próximo de zero para os fluidos naturais, ele é fator determinante nas novas emendas ambientais. Um exemplo é a nova regulamentação de F-Gas da União Europeia, a qual prevê que, a partir de 2025, equipamentos self possam funcionar apenas com fluidos refrigerantes de GWP abaixo de 150.

Acreditamos que esse aumento na carga de fluido refrigerante trarátrês impactos principais no mercado brasileiro: o crescimento das aplicações com equipamentos self, a popularização de compressores com velocidade variável e o aumento da eletrônica embarcada. Quando temos um mote pró-ambiental em equipamentos de refrigeração, não faz sentido vender para o cliente apenas um fluido refrigerante de baixo GWP como o R-290, mas é necessário, também, oferecer uma solução com a melhor eficiência energética em termos de componentes. Uma das maneiras mais difundidas para reduzir o consumo de energia de um sistema self é a utilização de compressores de velocidade variável, os quais evitam partidas excessivas, melhorando o COP do sistema. Esse tipo de compressor funciona melhor quando combinado com sistemas mais completos de automação, que garantem respostas mais rápidas, geração de alarmes de mau funcionamento, indicação de condensador sujo, entre outros.

César Augusto Pacheco, pesquisa e desenvolvimento da Eletrofrio.

 

 

 

 

 

 

 

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