A forma mais eficaz de obter a melhor contribuição é favorecer a inalação antes da mistura com o ambiente
1.Generalidades
A distribuição do ar tem uma contribuição essencial na obtenção da QAI, qual seja, de proporcionar aos ocupantes dos ambientes climatizados usufruírem de ar insuflado na condição de ar puro, que se admite ser a condição oriunda das unidades de tratamento do ar de ventilação.
Considerando a ocorrência de geração de partículas poluentes no espaço interior ocupado, a forma mais eficaz de obter a melhor contribuição é favorecer a inalação antes da mistura com o ambiente, provendo o trajeto entre a insuflação e o ocupante, o mais direto e homogêneo possível.
Para os ocupantes, resulta em reduzir o risco de inalar partículas poluentes em suspensão no ar do ambiente interior e minimizar o risco de contaminação cruzada.
Neste aspecto, os processos zona de ventilação protegida têm papel fundamental, podendo reduzir em até 20 vezes a probabilidade de contrair doenças transmissíveis pelo ar (1).
A distribuição de ar em sistemas de climatização de ambientes em geral, pode e deve adotar essa tecnologia como referência sem, necessariamente, constituir-se como tal em sua plenitude.
Estudos mostram que a adição de ar exterior tratado não é suficiente para sozinha, reduzir substancialmente a exposição a poluentes internos. É essencial, pois, praticar o conceito de zona de ventilação protegida, minimizando a mistura de ar entre ambientes distintos e favorecendo a inalação do ar de ventilação, não necessariamente ar exterior em sua totalidade, embora desejável.
Com respeito às temperaturas do ar de insuflação e movimentação de ar no ambiente, os sistemas tradicionais de climatização, em sua maioria, utilizam um diferencial de temperatura de cerca de 11°C entre insuflação e ambiente, dada a necessidade de proceder a desumidificação concomitantemente com o resfriamento. Para essa condição, velocidades terminais na zona de ocupação entre 0,13m/s e 0,18m/s são recomendadas.
Já para processos que adotam tratamento de ar por cargas desacopladas, cujas temperaturas de insuflação atingem 16°C e superiores (exemplo sistemas de insuflação pelo piso), maiores velocidades do ar podem ser adotadas sem que provoquem o efeito draft.
Nos sistemas por resfriamento evaporativo ocorrem diferenciais de temperatura em torno de 3°C, admitindo-se velocidades do ar de 0,46 m/s e até maiores, o que significa propiciar sensação de resfriamento de 4°C por movimentação do ar e o consequente efeito brisa, contribuindo significativamente para abaixar a temperatura efetiva de conforto, considerando tratar-se de sistema de climatização natural (2).
Catálogos de fabricantes de difusores de ar disponibilizam, a partir das vazões a serem insufladas e alturas de teto específicas às aplicações, os valores resultantes de velocidades no ambiente relativas aos respectivos alcances específicos a cada caso, bem como os níveis de ruído e queda de pressão estática.
A mitigação da mistura de ar entre ambientes requer escalonamento da difusão de ar e descentralização da captação, além de posicionamentos relativos adequados.
Outro conceito importante a ser abordado é o resfriamento radiante, que opera com temperaturas de cerca de 22ºC para as superfícies radiantes, oportunizando que até 2/3 do calor perdido através da pele humana seja por radiação térmica, o que reduz a carga térmica a ser trocada pelo corpo humano por convecção com o ar e tem influência na sensação térmica provocada pela movimentação do ar no recinto ocupado.
Para a hipótese contrária de temperaturas radiantes acima da temperatura de bulbo seco do ar interno, em torno dos 30°C, a perda de calor por radiação através da pele seria de apenas 1/3, enquanto cessaria para temperaturas radiantes de 34,4°C. Acima dos 34,4°C inverte-se o processo e o corpo passa a ganhar calor emitido pela superfície radiante (2).
Portanto, a seleção do tipo de insuflador e a velocidade terminal a ser adotada para o ar, dependem de critérios que são complementares, não se constituindo numa mera dedução a partir de tabela de dados técnicos constantes de catálogos de fornecedores.
Mais uma vez evidencia-se que a escolha, selecionamento e disposição dos insufladores de ar devem considerar parâmetros correlatos de conforto, quais sejam:
– Temperatura de bulbo seco;
– Umidade relativa;
– Velocidade do ar na zona de ocupação;
– TMR (temperatura média radiante) dos entornos.
Esses 4 fatores interagem mutuamente. Prescrições de conforto envolvem pelo menos três deles, mas, preferencialmente os quatro.
2.Especificidades
2.1 Distribuição de ar por deslocamento vertical convectivo
O processo de distribuição de ar por deslocamento vertical convectivo tem um conceito compatível com o processo abordado de zona de ventilação protegida, contribuindo significativamente para mitigar a presença de contaminantes em suspensão – particulados ou na forma de gás – na inalação pelos ocupantes.
Esses contaminantes, em sua maior parte, situam-se nos espaços mais altos, junto ao teto, e nos processos de displacement flow são dirigidos para as zonas de exaustão, ou de recirculação (3).
A insuflação vertical vinda do piso, ou em nível horizontal próxima ao piso, dirige-se verticalmente, por convecção, e pela proximidade com a zona de respiração resulta em ar mais limpo para a inalação por estar livre dos contaminantes estratificados junto ao teto.
Na insuflação pelo teto o fluxo atinge e conduz parte dos contaminantes que se estratificariam, conduzindo-os em direção ao destino do fluxo, a região de ocupação pelos usuários do sistema e, por conseguinte, a inalação.
Como vantagem adicional em relação aos sistemas tradicionais com dutos e difusores de teto, adaptam-se às mudanças de layout sem requererem alterações que não sejam apenas reposicionamento de bocas de insuflação.
2.2 Ventilação personalizada
A ventilação personalizada é um processo que otimiza a QAI e eficientiza o uso da energia, podendo resultar em redução de até 51% no consumo energético pelos sistemas de AVAC (4).
É uma inegável evolução se comparada ao processo tradicional de insuflação por mistura de ar, ensejando ao ocupante da estação de trabalho inalar ar 100% renovado, uma vez que o posicionamento estratégico do insuflador permite dirigir o jato à zona de respiração e se contrapor ao fluxo de convecção vertical do sistema complementar de insuflação que climatiza o volume total do espaço. Isto configura a otimização da QAI, considerando o bem-estar do ocupante.
Propicia, também, ao ocupante, escolher a condição termohigrométrica de sua preferência, pois permite modular o fluxo de ar, desviá-lo, e ainda bloqueá-lo ao se ausentar da estação de trabalho.
Considerando que a insuflação personalizada cria uma pluma de ar em volta do corpo do usuário, gerando um fluxo por convecção natural ascendente equivalente ao efeito chaminé, o restante do espaço pode operar com temperatura mais alta, em até 4°C acima da correspondente à da estação de trabalho.
Isto configura o benefício quanto ao aspecto da eficácia no uso da energia para obtenção do resultado pretendido, com a melhor relação custo/benefício. Trata-se, portanto, de solução indicada para situações em que os ocupantes desenvolvem as atividades no âmbito das respectivas estações de trabalho.
2.3 Vigas frias com ar primário seco e frio
As contribuições das vigas frias na otimização dos processos de climatização estão comprovadas através do uso já consolidado e respaldado pelas vantagens técnicas e econômicas do processo de desacoplamento total entre cargas de resfriamento e desumidificação, que consiste na independência tanto da produção da energia, quanto no controle da temperatura e da umidade relativa do ar interior – THIC na sigla em inglês – (5).
Vigas frias, especialmente vigas ativas, constituem-se em ótima opção para realização do processo, pois viabilizam o resfriamento por sistema ar/água, dispondo de serpentinas de resfriamento distribuídas no espaço a climatizar e reduzindo fortemente instalações de dutos de condução de ar, UTAs, espaços para casas de máquinas e permitindo reduzir alturas de entreforros. A utilização da água, em substituição ao ar, para a distribuição da energia de resfriamento ao longo da edificação, resulta em otimização energética e física, em razão da relação massa x calor específico 3.400 vezes maior para a água, em relação à correspondente para o ar.
Para conduzir a mesma quantidade de energia térmica, necessita-se tubo de diâmetro 25 mm para o transporte da água, enquanto seria necessário duto de 45 cm x 45 cm para transporte do ar (6). Em avaliação holística entre os 2 processos (tudo ar e ar/água), artigo publicado no Ashrae Journal concluiu por uma redução de 57% na vazão de ar em relação a um sistema por processo VAV com insuflação pelo piso e idêntica redução no número de difusores e na demanda elétrica de ventiladores. O custo inicial adicional resultou em pay-back simples inferior a 2 anos.
Considerando a melhoria da eficiência termodinâmica por utilizar altas temperaturas de resfriamento, a redução no consumo elétrico comparado ao sistema por processo VAV resultou em 42% (7).
Instalações de grande porte para centros de compras distintos, numa mesma localização geográfica e com projetos de nossa autoria, indicaram, após medições mensais durante 1 ano, economia de 39,5% no consumo de energia favorável ao sistema com vigas frias ativas, em relação a sistema VAV, constituídos por processo com cargas acopladas no sistema VAV tudo ar e com cargas desacopladas no sistema ar/água, ambos dotados de unidades DOAS.
Acrescentem-se as vantagens do processo de tratamento de ar por vigas frias ativas, livre de contaminantes provocados por biofilme resultante da condensação que ocorre em sistemas com cargas acopladas, e o baixo diferencial de temperatura do ar, como característica inerente ao processo ar/água, cuja insuflação se dá a cerca de 18,5°C, permitindo taxas de indução de ar de até 1 para 5 em relação ao ar primário, sem que venham a ocorrer drafts, como já abordado para os sistemas de resfriamento evaporativo.
O ar primário tem vazão compatível com a necessária renovação de ar e é desumidificado em DOAS que pode atender 100% da carga latente interna total, mantendo a temperatura de orvalho definida para o ar interior e podendo ser controlada por processo de ventilação por demanda (DCV). Para o fluxo secundário induzido, há alternativas de bicos de indução para adaptá-lo à carga de resfriamento e ao arranjo físico, garantindo, também, equalização no suprimento da renovação de ar. Além disso, uma criteriosa escolha da eficiência do sistema de filtração de ar das DOAS, permite atender às exigências de QAI, apesar da não provisão de filtros de ar para o fluxo de indução.
Ressalta-se que as vigas frias contribuem, ainda, para mitigar a mistura de ar entre espaços atendidos de uma determinada zona térmica, por evitar a confluência dos fluxos de retorno para um único destino, como ocorre nos sistemas tudo ar de recirculação, gerando um fluxo com trajeto homogêneo da insuflação até o recolhimento pela indução, sem intercorrências ou turbulências com outros fluxos.
2.4 Distribuição de ar em edificações termicamente ativas: um estudo de caso (8)
Abordagem quanto à distribuição de ar
Considerando a reduzida vazão de insuflação na ala 2, em razão da inércia térmica e resfriamento por pisos e tetos radiantes, foram incorporados ventiladores axiais de teto distribuídos ao logo dos espaços, associados à insuflação do ar seco e frio vindo da DOAS para garantir a movimentação do ar nos ambientes e assim atender um dos parâmetros que influi na determinação da temperatura efetiva, juntamente com a temperatura de bulbo seco do ar e a umidade relativa, em processo de interação mútua.
Para o ar parado, o efeito sensação de resfriamento por movimentação do ar é nulo, atingindo 2,8°C para velocidade 0,22 m/s e 3,9°C para velocidade 0,45 m/s (2). Trata-se, evidentemente, de um critério importante, porém sutil, que deve influenciar a relação entre distribuição do ar, QAI e conforto térmico, sem o qual a distribuição de ar incorreria em deficiência de conforto térmico, embora não incorresse em erro técnico de dimensionamento do sistema dutos/insufladores, isoladamente falando, mas não resultaria em solução eficaz.
Quanto aos custos e propósitos
A redução em UTAs e distribuição de ar do sistema VAV igualou o custo do processo radiante no conceito Edificações Termicamente Ativas.
A decisão pela edificação com duplo sistema, decorreu da falta de consenso entre equipes de engenharia do Empreendedor e de Consultoria Técnica contratada, surgindo a decisão administrativa pela aplicação das 2 soluções simultaneamente, tendo sido a edificação dividida ao meio e aplicada uma solução em cada ala, utilizando idênticos equipamentos de produção de frio, sistemas de arrefecimento, sistemas de bombeamento e procedimentos de suprimento elétrico, controle e automação, interligados ao laboratório da universidade de Berkeley, Califórnia – USA.
A edificação (foto que abre esse artigo), está situada em Hyderabad, Índia, constituindo-se no bloco de produção da Infosys, grande indústria de desenvolvimento de softwares, e tem como meta servir como laboratório para conceber o uso da energia térmica destinada a edificações novas e retrofitadas do Grupo Empreendedor, na Europa e Ásia. Nos 5 anos seguintes, cerca de 186.000 m² de edificações termicamente ativas foram implementadas pelo Grupo, resultando em redução no uso de energia per capita em toda a empresa de mais de 40%, acumulando uma economia superior à US$ 50 milhões.
Referências:
(1) REHVA Journal – June 2014 (Protected zone ventilation)
(2) Evaporative Air Conditioning HANDBOOK – Watt
(3) ASHRAE Journal – November 2003 (Underfloor & Overhead)
(4) ASHRAE Journal – November 2011 (Advanced Air Distribution)
(5) IEA Annex 59
(6) REHVA & ASHRAE 21º Guidebook
(7) ASHRAE Journal – December 2009 (Cooling With Less Air)
(8) ASHRAE Journal – May 2014 (VAV vs. Radiant)
Veja também:
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Um bom projeto de distribuição do ar contribui para a qualidade do ar
Para cada tipo de aplicação, um sistema de difusão
Empresas conscientes têm aumentado as ações para mitigação de riscos