Um sistema de ar-condicionado central tem o tempo de vida útil estimado em 25 anos. Entretanto, a depender da maneira como é gerido, os sinais de desgaste vêm bem antes do final de vida esperado. Trocadores de calor, por exemplo, podem perder eficiência pelo efeito de incrustações. Bombas de água ou ventiladores já não conseguem movimentar a mesma quantidade de fluidos conforme estabelecido em projeto. As soluções podem são variadas, desde substituições ou retrofits, até intervenções localizadas. Mas, acima de tudo, os cuidados com o plano de operação, manutenção e controle fazem toda a diferença.
“Todo equipamento sofre desgaste ao longo do tempo e pode perder eficiência e eficácia, seja por ação da operação ou por fatores ambientais. Desgastes por atrito, corrosão por diversas formas ou até mesmo erros operacionais podem causar pequenos danos que se acumulam ao longo do tempo. Estes efeitos cumulativos podem implicar que, depois de um certo tempo, os trocadores de calor não tenham a mesma eficiência de troca térmica, ou compressores, ventiladores e bombas não desloquem mais a mesma quantidade de fluido, e que válvulas não tenham mais a mesma capacidade de controle”, explica Rafael Dutra, Coordenador de Aplicação da Trane.
Dutra indica o caminho para a recuperação. “A forma como estes equipamentos são mantidos é fundamental para o grau de deterioração dos componentes por dois motivos: condição de operação e falhas em cadeia. Caso a manutenção seja feita de forma adequada e não haja, por exemplo, um grau elevado de incrustação dos trocadores de calor, podemos dizer que as condições de operação estão dentro do previsto para os componentes do equipamento e a tendência é de maior durabilidade e vida útil. Já no caso das falhas em cadeia, falamos de situações de negligência ao ponto de uma operação inadequada de um componente levar à falha de outro; um exemplo seria o caso de uma válvula de um compressor estar danificada e o excesso de vibração prejudicar outros componentes do compressor levando a falhas.”
“Pensando especificamente em uma central de água gelada, é comum nos depararmos com instalações que perderam eficiência com o passar de 10 ou 15 anos de operação, porém, também é normal encontrarmos instalações ainda novas com problemas de perda de performance e isto pode não ter nada a ver com deterioração do sistema. É importante entender de onde vem a eficiência de uma central de água gelada. Na maioria das vezes se compara o consumo de energia apenas dos chillers, mas uma central de água gelada é composta por chillers, bombas, torres de resfriamento, válvulas, automação, entre outros. Pensando no lado ar, da mesma forma, possuímos diversos componentes como as unidades de tratamento de ar (fancoils), dutos, dampers, grelhas, difusores, automação etc. Tudo isto compõe um sistema de água gelada que possui também seu valor de eficiência energética como “sistema” (central de água gelada + condicionamento do ar) e que, operando de forma incorreta ou deteriorada, impacta no objetivo final e mais importante, que são as condições de conforto e qualidade do ar, por exemplo”, complementa Cristiano Brasil, da engenharia de aplicação da Midea Carrier.
João Carlos Antoniolli, Gerente de Engenharia de Aplicação da Johnson Controls-Hitachi, considera que o tema desempenho do sistema possui toda a pertinência. “Eu diria que o efeito da deterioração acontece, sim, ao longo do tempo e se manifesta caso a caso. O impacto se observa na eficiência ambiental, energética e na propriedade com a manutenção ao longo da vida útil. Como se trata de um sistema indireto de condicionamento por meio da circulação de água gelada, o conforto pode ser comprometido na medida em que os equipamentos já não atendem as cargas térmicas e podem impactar na qualidade do ar, perdendo o controle sobre as variáveis temperatura sensível e umidade. Se o equipamento de água gelada pode ou não perder eficiência, não se chega facilmente a um consenso e muitos fatores acabam entrando em pauta. Existe pouca literatura sobre o tema e o que se encontra são manifestações de profissionais que cuidam de contratos de manutenção e que trazem suas experiências e observações com máquinas instaladas e rodando. Pelo que venho acompanhando por mais de 40 anos, as leituras com instrumentação apropriada em campo comprovam que existe, sim, a perda de eficiência dos equipamentos ao longo dos anos de utilização.”
“Toda instalação de ar-condicionado, da mais simples à mais complexa, está sujeita às variações de desempenho energético e de conforto no decorrer de seu uso. Os sistemas de expansão indireta, sofrem um pouco mais com o tempo. Sistemas de ar-condicionado são essencialmente mecânicos e, como qualquer outro, sofrem com o desgaste de seus componentes. Tais desgastes geralmente são decorrência de manutenção falha e operação fora do padrão estabelecido pelos fabricantes ou pelo projeto e impactam diretamente nos padrões de desempenho estabelecidos no momento de sua implantação” pontua Robson Previatti, da engenharia da Gree.
Na linha de todos os demais, George Szego, da Mecalor, explica que se o sistema não for bem cuidado, pode sofrer deterioração ao longo do tempo sofrendo perda no desempenho global em relação as condições de projeto. “Algumas das principais causas para a deterioração de instalações de água gelada são: falta de manutenção dos equipamentos principais e acessórios, problemas frequentes de operação, configuração inadequada do sistema de automação, condições ambientais do local de instalação e qualidade de água.”
“O desgaste dos componentes de uma máquina é natural. Portanto, seguir as recomendações de manutenção dos fabricantes é essencial para manter a confiabilidade do funcionamento. Por exemplo, usar peças de reposição incorretas para atender a quebra de um equipamento, ou deixar de limpar filtros de água e condensadores, vai acelerar o processo de deterioração da instalação. Com relação à operação, forçar o rearme das máquinas sem solucionar a causa dos alarmes, jumper de falhas críticas e ausência de processo de purga de ar das tubulações de água gelada, certamente influenciam na perda de eficácia do sistema. A automação também pode ter um impacto importante na redução da vida útil, por exemplo, quando a configuração do sistema não estabelece tempos entre partidas para compressores, bombas e ventiladores. O ambiente onde estão instalados os equipamentos influencia fortemente a frequência de manutenção, e o nível potencial de deterioração. Por exemplo, um equipamento instalado em ambiente empoeirado pode entupir filtros de ar e trocadores de calor, ou o enclausuramento das máquinas prejudica a circulação de ar”, continua Szego.
Marcos Santamaria Alves Correa, da engenharia da Indústrias Tosi, explica didaticamente como se dá a perda de desempenho dos sistemas de AVAC-R. “Nos fan coils, que são as unidades terminais que efetivamente climatizam os ambientes, a deterioração se dá por conta da deposição de sujeira na forma de material particulado, principalmente nos filtros de ar, mas, também, nas serpentinas de resfriamento e nos ventiladores, especialmente nos casos em que não tenhamos filtros de ar de baixa eficiência nos equipamentos. Já pelo lado da água gelada podemos ter perda de rendimento por conta de sujeira nos filtros Y dos equipamentos e formação de incrustações nas tubulações.”
Santamaria ressalta que nas centrais de água gelada, o acúmulo de sujeira e formação de incrustações, especialmente nos trocadores de calor dos chillers provocam uma redução na capacidade de troca térmica que obriga os equipamentos a trabalharem com temperaturas de evaporação mais baixas e temperaturas de condensação mais altas, aumentando o diferencial de pressão a ser vencido pelo compressor e, consequentemente, o consumo de energia. “Outro fator que promove a redução da eficiência dos chillers ao longo do tempo é a deposição do óleo de lubrificação dos compressores, que circula junto com o gás refrigerante, nas paredes dos trocadores de calor (tanto evaporadores como condensadores), que tem o mesmo efeito de isolamento térmico da incrustação no lado da água. Este é o tipo de problema que pode ser eliminado, já na causa, com o uso de compressores com mancais magnéticos isentos de óleo. Outro ponto que merece atenção são as torres de arrefecimento de sistemas de condensação à água, se a distribuição de água não estiver uniforme a troca térmica é reduzida e a temperatura da água de condensação na saída da torre aumenta, o que também provoca aumento no consumo de energia; também não podemos esquecer da necessidade de avaliação periódica dos riscos de desenvolvimento da bactéria Legionella nestes equipamentos, o que estará ligado à qualidade do ar interior.”
Como reverter a perda de eficiência?
Antoniolli explica que a deterioração pode acontecer por desgaste mecânico, qualidade no fornecimento de energia, qualidade da água gelada e de condensação e rotinas de manutenção incompletas que não atendem as recomendações dos fabricantes. “Também depende da tecnologia embarcada no equipamento. Existem máquinas chamadas convencionais, com menores custos na aquisição e que necessitam de uma rotina de manutenção mais intensa, e máquinas mais modernas, como é o caso das que utilizam compressores com mancais magnéticos, dimensionadas para trabalhar ao longo de toda a sua vida útil sem paradas para manutenção devido ao trabalho mecânico sem atrito e desgaste mecânico. Mas, ainda assim, sobra a rotina de manutenção nos trocadores de calor que podem ser afetados pela qualidade da água e resultar em deterioração.”
O Gerente de Engenharia de Aplicação da JCH diz, ainda, que a deterioração se manifesta pela perda de capacidade dos equipamentos e/ou pelo aumento no consumo de energia. “Ou compromete o kW térmico, diminuindo a sua capacidade de entregar água gelada no set point de projeto, ou aumenta o kW elétrico consumido. Como sabemos, a performance é medida em COP no Sistema Internacional, em que se mede pelo kW térmico dividido pelo kW elétrico, sendo que, ao diminuir o térmico ou aumentar o elétrico, estaremos diante de uma deterioração mecânica que impacta o consumo elétrico ou falta de manutenção.”
Para Antoniolli as medidas para a volta às condições de projeto podem ser várias, desde o retrofit, com a troca de alguns componentes dos equipamentos dentro da sua vida útil, com boas práticas de PMOC e, por fim, com a possibilidade do replacement. “Para cada oportunidade devem ser feitas as avaliações CAPEX ou OPEX e construir a decisão em busca da melhor solução. É comum hoje em dia montar um cenário com máquinas com menor consumo de energia que facilmente justificam o investimento na base da troca para, assim, eliminar na raiz os efeitos do desperdício, manifestados pela deterioração.”
Cristiano Brasil explica que a deterioração ou perda de performance de uma central de água gelada pode se dar por diversos fatores, como vazão deficiente de bombas de água gelada (primárias/secundárias) e bombas de água de condensação, incrustação ou má distribuição de água no enchimento das torres de resfriamento, incrustação nos tubos do condensador e evaporador (ou serpentinas sujas no caso de chillers com condensação a ar), válvulas desajustadas, automação inoperante e alto desbalanceamento de tensão/corrente.
A manifestação da deterioração na CAG, ainda segundo Brasil, vai se manifestar de acordo com o tipo de controle e visibilidade que o cliente possui. “O sintoma mais fácil de se constatar é em relação a perda de capacidade e/ou performance dos chillers instalados, porque são os maiores consumidores de energia elétrica. A partir deste sintoma, se faz necessário buscar a causa ou as causas que podem ser qualquer um dos problemas mencionados anteriormente ou o conjunto de fatores.”
O engenheiro da Midea Carrier recomenda algumas ações para reverter a tendência. “Em relação a componentes, as principais ações seriam manter contrato de manutenção com empresas especializadas, manter os trocadores de calor e torres de resfriamento sempre limpos, vazões de bombas sempre ajustadas, sistemas de válvulas e de automação sempre em correto funcionamento e, o mais importante, como qualquer instalação deveria implementar, realizar sempre o rebalanceamento do sistema como um todo. Não podemos esquecer que todos estes componentes trabalham em conjunto e são importantes para que as condições de projeto sejam seguidas.”
Previatti, da Gree, aponta como primeiro sinal de deterioração da CAG, a impossibilidade dos chillers de alcançarem o setpoint de projeto, “revelando um problema direto com a manutenção do equipamento, após isso os pontos de atenção são com as bombas que podem estar operando fora dos parâmetros de projeto.”
Para a reversão da tendência à deterioração, Previatti explica que o principal é conhecer o projeto e realizar um diagnóstico claro das razões pelas quais o sistema está operando de forma inadequada. “Com frequência o problema se encontra em parâmetros incorretos na automação, alterações no balanceamento no sistema de dutos ou até mesmo improvisos temporários realizados em campo e que se tornam permanentes. Por isso que uma equipe de manutenção focada e experiente em sistemas de água gelada é fundamental.”
Dutra, por sua vez, argumenta que não é simples detectar os efeitos da deterioração nos sistemas de água gelada, visto que muitos destes podem ser confundidos com problemas na operação ou problemas em sistemas ligados. “Caso seja detectado o não atendimento das condições de conforto, por exemplo, é fundamental seguir toda a cadeia de componentes dos sistemas desde a difusão de ar até a central de água gelada. Não é incomum o problema estar no meio do caminho e o chiller levar a culpa. Muitas vezes, também atribuem o famoso 1% de redução de performance ao ano, um verdadeiro mito no setor que não tem fundamentação teórica ou muito menos de uma prática bem documentada. E, com isso, determinam que a central deteriorou, pois não foi possível atingir o setpoint de conforto nos ambientes.”
“Isolando o problema na central”, continua Dutra, “algumas questões podem ser observadas: o chiller não fornece água na temperatura de setpoint, mesmo depois de verificar que a vazão de água é a correta conforme seleção. O problema pode ser mecânico ou ligado à automação do equipamento ou mesmo da central. Também podem ocorrer desligamentos indesejados, alarmes, vibração e ruídos excessivos. Os desligamentos podem ser sinal de que algo está errado e que o sistema de controle do equipamento está prevenindo um problema maior de acontecer, portanto, é fundamental que um técnico capacitado faça uma avaliação urgente do equipamento. É comum que o problema seja externo, envolvendo alimentação elétrica ou o sistema de bombeamento, daí a necessidade de verificar estes sistemas também. Caso o problema seja na central de fato, é preciso verificar alguns pontos: o sistema de controle está operando de maneira adequada? Posso confiar nas leituras dos sensores e os controladores atuam de maneira correta? E as válvulas respondem de acordo? Se sim, qual é o estado das bombas? Os selos estão de acordo e não há corrosão que possa ter comprometido o rotor?”, recomenda o Coordenador de Aplicação da Trane.
O engenheiro da Tosi avança nas recomendações para uma boa qualidade do ar interno. “Podemos dividir os sistemas de tratamento de ar externo de renovação em 3 tipos: Casas de máquinas funcionando com caixas de mistura ou mesmo caixas de mistura incorporadas a equipamentos, caixas de ventilação com filtros, e equipamentos DOAS – Dedicated Outdoor Air Systems. Qualquer que seja o método de tratamento do ar de renovação precisaremos trabalhar na limpeza e higienização periódica de seus componentes, substituição de filtros de ar e verificação e ajuste da vazão de ar de renovação às necessidades da instalação. Os efeitos desta deterioração são a redução da taxa de renovação de ar e da qualidade do ar de renovação inserido nos ambientes. “
Análise e supervisão
Há unanimidade em um ponto: impossível ter sistemas operando dentro das condições de projeto e com perdas mínimas de desempenho sem um adequado Plano de Manutenção, Operação e Controle (PMOC). “Não existem sistemas de expansão indireta com água gelada para funcionar ao longo de sua vida útil, por volta de 20 a 25 anos, sem que seja feito um ótimo PMOC. Dentro do plano de manutenção será feito o acompanhamento dos parâmetros de manutenção e de preferência com uma automação que permita avaliar os dados de consumo em busca da otimização. Otimização é uma forma de evitar o desperdício e, também, de corrigir as distorções da deterioração frente as premissas do projeto. Também o comissionamento pode ser utilizado como uma das etapas de análise e supervisão para agir de forma proativa diante dos sinais de deterioração”, sentencia Antoniolli.
Na mesma linha, Dutra é enfático: “Uma manutenção eficaz é fundamental. Se o equipamento foi devidamente instalado e as condições operacionais estão de acordo, sendo fornecido energia elétrica e água em condições adequadas, então será a manutenção que irá determinar a vida útil do equipamento. Verificações periódicas dos componentes conforme instruções do fabricante, além da adoção de sistemas inteligentes de monitoramento contínuo e remoto, permitem que os efeitos do desgaste sejam percebidos ainda na sua infância e problemas maiores sejam evitados. Um bom plano de manutenção irá verificar no período adequado cada componente, cada leitura do sistema de controles e fará previsões de quando será necessário trocar um componente.”
“Eu costumo fazer uma analogia da qualidade do ar interior ao fogo. Nos treinamentos de brigadas de incêndio sempre se menciona o triângulo do fogo que são: combustível, comburente e fonte de calor. Sem qualquer um destes 3 componentes o fogo se acaba. Da mesma forma acontece com a qualidade do ar interior, se os 3 componentes são projeto bem elaborado, instalação bem-feita e manutenção adequada, sem qualquer um deles também não teremos qualidade do ar interior. Portanto, manutenção é fundamental para a garantia da QAI, com limpeza, higienização, verificação periódica das vazões de ar externo de renovação e substituição de filtros de ar”, conclui Santamaria.
Assim, faz todo o sentido manter ações de análise e supervisão permanente dos sistemas de água gelada. “Ao garantir que nenhum componente opere de modo a causar danos em outros componentes, as ações de supervisão contínua limitam os desgastes a estes componentes primários, que costumam ser mais baratos. É mais fácil, por exemplo, trocar um rolamento do que um eixo ou um motor, porém, este rolamento precisa ser verificado rotineiramente. Outra forma é agir sobre as condições de operação, garantir que trocadores estejam limpos, que a qualidade da água esteja de acordo com as especificações, entre outros”, pondera Rafael Dutra.
“A supervisão constante de qualquer sistema é imprescindível e deveria ser implementada. É muito mais econômico se investir em manutenções preventivas e preditivas do que realizar um investimento emergencial em uma manutenção corretiva. Análises preditivas como análise de óleo, análise de vibração, termografia, análise de qualidade da água, ensaios da situação interna dos tubos (denominado Eddy Current Test), rebalanceamento de bombas, torres etc., dentre outras, são importantes parâmetros e ações de monitoramento e controle. Todas estas informações administradas por um bom sistema de automação podem antecipar diversos problemas, evitar custos extras desnecessários e manter os sistemas de água gelada no melhor ponto de performance possível”, finaliza Cristiano Brasil.
Veja também:
Qualidade da água é primordial para o bom desempenho
Correto selecionamento de válvulas e controles reduz queda de performance
Ronaldo Almeida
ronaldo@nteditorial.com.br